É certo ou errado jurar?

“24E disse Abraão: Eu jurarei. 31Por isso se chamou aquele lugar Berseba, porquanto ambos juraram ali.” (Gn 21:24,31), “34Eu, porém, vos digo que de maneira nenhuma jureis; nem pelo céu, porque é o trono de Deus; 35Nem pela terra, porque é o escabelo de seus pés; nem por Jerusalém, porque é a cidade do grande Rei; 36Nem jurarás pela tua cabeça, porque não podes tornar um cabelo branco ou preto. 37Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; Não, não; porque o que passa disto é de procedência maligna.” (Mt 5:34-37). Aqui cito o comentário de William Hendriksen em Mt 5:33-37, no livro Comentário do Novo Testamento, Mateus, Volume 1, William Hendriksen, Pgs 432 a 436, Editora Cultura Cristã., onde aborda bem e esclarece o assunto:

Novamente aqui, como anteriormente, o que fora dito pelos homens de outrora não estava certo. Era um bom resumo da letra da lei concernente ao juramento (Lv 19:12; Nm 30:2; e cf. Dt 23:21). Pelas palavras de Jesus, contudo, é bastante óbvio que os antigos, e assim também os escribas e fariseus dos dias de Jesus, tenham se equivocado na ênfase. Como é claro do contexto em cada caso, a ênfase divinamente pretendida era a seguinte (note-se o itálico):

“Nem jurareis falso pelo meu nome (Lv 19:12). “Quando um homem fizer voto ao Senhor, ou fizer juramento… não violará a sua palavra” (Nm 30:2). “Quando fizeres algum voto ao Senhor, teu Deus, não tardarás em cumpri-lo“ (Dt 23:21). Ou, usando a fraseologia dos intérpretes: “Você não quebrará o seu juramento, mas guardará os votos que tem feito ao Senhor.”. Em cada caso a ênfase está posta na veracidade: uma pessoa deve ser veraz ao solenizar sua promessa com um juramento.

Sua intenção deve ser sincera. Também deve ser fiel no cumprimento do voto, ou seja, deve cumprir sua promessa. Ainda em conexão com as promessas que Deus mesmo confirmou com um juramento, é a veracidade que é enfatizada: “o SENHOR jurou com verdade a Davi, e não se apartará dela: Do fruto do teu ventre porei sobre o teu trono.” (Sl 132:11). E em conexão com “as duas coisas imutáveis” (a promessa e o juramento), das quais os crentes extraem forte ânimo (Hb 6:18), a ênfase é que “é impossível que Deus minta”. Ora, essa ênfase na veracidade “no coração” ou “no íntimo”, a ausência de “falsidade e engano” (Sl 15:2; 51:6; 24:4, respectivamente), está bem distribuída nos escritos do Antigo Testamento. Além das referências já apresentadas do Pentateuco e dos Salmos, ver também Pv 8:7; 12:19; Jr 5:3; Os 4:1; Zc 8:16; Ml 2:6; e cf. Mq 6:8.

Pelas palavras de Jesus em Mt 5.34-36, é evidente que os tradicionalistas tinham desprezado a ênfase, de modo que as passagens do Pentateuco agora eram lidas assim: “Nem jurarão falso pelo meu nome” (Lc 19:12). “Quando um homem fizer voto ao Senhor, ou fizer juramento… não violará a sua palavra” (Nm 30:2). “Quando fizeres algum voto ao Senhor, teu Deus, não tardarás em cumpri-lo” (Dt 23:21). Sumário: “Você não quebrará o seu juramento, mas guardará os votos que tem feito ao Senhor.”.

Em outras palavras, no pensamento dos escribas e fariseus e seus precursores, um voto jurado “ao Senhor” devia ser guardado; ao contrário, um voto em relação ao qual não se mencionava expressamente o nome do Senhor era considerado de somenos importância. Não era necessário cumpri-lo tão conscienciosamente. E assim na conversação diária os juramentos começaram a multiplicar-se, “pelo céu”, “pela terra” e “por Jerusalém”, e, de acordo com 23:16 e 18, ainda “pelo templo” e “pelo altar”. Com o fim de impressionar, uma pessoa podia pronunciar um juramento desses “exagerando” e fazendo enormes promessas. Se a afirmação feita era mentira e se a promessa fora feita sem a intenção de cumpri-la, isso não era tão ruim assim, contanto que não fosse jurado em nome do Senhor.

Jesus proíbe essa hipocrisia. Ele mostra que as distinções minuciosas e sutis por meio das quais os rabinos classificavam os juramentos como os que eram absolutamente obrigatórios, os que não eram tão obrigatórios e os que de forma alguma comprometiam, ou, seja qual for sua classificação, estavam completamente destituídos de razão. Ele lhes afirma que um juramento “pelo céu” deve ser veraz e deve ser cumprido, porque o céu não é o trono de Deus? O homem que pronuncia tal juramento está invocando a Deus. Da mesma forma o juramento “pela terra”; porque, não é a terra o escabelo dos pés de Deus? (Is 66:1).

Igualmente o juramento “por Jerusalém”; ela não era a cidade do grande Rei? (Sl 48:3). Em outras palavras, quando os juramentos são pronunciados em apelo a qualquer desses objetos, na verdade estavam sendo tão obrigatórios como se o nome de Deus fosse invocado expressamente em conexão com eles. Ainda havia aqueles que juravam “pela sua cabeça”, o que significava: “Que eu perca a minha cabeça — ou seja, que eu perca a minha vida — se o que estou dizendo não for a verdade ou se eu não cumprir minha promessa.” Contudo, Jesus indica que ninguém pode mudar a cor intrínseca de seus cabelos. É Deus, tão-somente ele, quem determina se em dado momento um cabelo fica branco ou preto. Visto que esta é a realidade, o juramento pela cabeça de alguém é ainda jurar por Deus, e é tão obrigatório como qualquer outro tipo de juramento.

A real solução do problema está no coração. A verdade deve reinar de forma suprema no coração. Por isso, na conversação diária com o nosso próximo, devemos evitar totalmente os juramentos. Pelo contrário, a pessoa deve tornar-se tão verdadeira, tão plenamente confiável, que suas palavras sejam acreditadas. Quando o crente deseja afirmar algo, que simplesmente diga: “sim!” E quando deseja negar algo, que simplesmente diga: “não!” Qualquer coisa que seja “mais forte” que isso é de origem maligna. E característica de certos indivíduos que são conscientes de que sua reputação em relação à veracidade não goza de boa fama, que quanto mais mentem mais afirmarão que o que dizem é “a pura verdade”. Têm o costume de entremear suas conversações com juramentos. Jesus diz que essa conduta perjura é oriunda “do maligno”, o criador de falsidades (Gn 3:1,4; Jó 1:9-11; Mt 4:6,10,11; Jo 8:44; At 5:3; e II Ts 2:9-11.29.

Isso significa que quando Jesus declara: “De modo algum jureis”, ele proíbe até mesmo os juramentos que são feitos nos tribunais? Ensina ele que em toda esfera das relações humanas não há qualquer lugar para a invocação solene do nome de Deus para substanciar uma importante afirmação ou promessa? De forma alguma! Tal ponto de vista seria contrário ao ensino da Escritura. Foi com um juramento que Abraão confirmou suas promessas ao rei de Sodoma e a Abimeleque (Gn 14:22-24; 21:23,24). Abraão igualmente exigiu que seu servo jurasse (Gn 24:3,9). O juramento é igualmente mencionado em conexão com Isaque (Gn 26:31), Jacó (Gn 31:53; cf. 28:20-22), José (Gn 47:31; 50:5), com “os príncipes da congregação” (Js 9:15) e com os filhos de Israel (Jz 21:5). Ver também Rt 1:16-18; II Sm 15:21; I Rs 18:10; e II Cr 15:14,15.

Com respeito aos próprios juramentos de Deus, às referências já mencionadas  podem acrescentar-se Gn 22:16; 26:3; Sl 89:3,49; 110:4; Jr 11:5; e Lc 1:73. Finalmente, foi sob juramento que Jesus declarou ser ele mesmo o Filho de Deus (Mt 26:63,64). Neste mundo de desonestidade e logro, o juramento é necessário para imprimir solenidade e garantia de confiabilidade a uma afirmação ou promessa importante. Não há nada em Mt 5:33-37, nem em qualquer outro lugar nas Escrituras, que proíba isso. Hb 6:16 confirma essa prática sem qualquer palavra de crítica negativa. O que temos em Mt 5:33-37 (cf. Tg 5:12) é a condenação do juramento improcedente, profano, desnecessário e, com freqüência, hipócrita, usado para impressionar e para condimentar a conversação diária. Contra esse mal Jesus recomenda a veracidade singela, tanto de pensamento como de palavras e atos.

Published in: on 8 de dezembro de 2012 at 19:33  Deixe um comentário  

The URI to TrackBack this entry is: https://asescrituras.wordpress.com/2012/12/08/e-certo-ou-errado-jurar/trackback/